O conhecimento da trajetória histórica é importante para sabermos se o legislador constituinte, de 1988, pretendeu adotar, antes da entrada em vigor do Código Civil, de 2002, a responsabilidade objetiva, aplicada na Legislação Especial - que derroga a Geral - ou se com a entrada em vigor da Lei Geral esta ampliou o que quis dizer o constituinte de 1988, numa aberração jurídica sem precedentes no Direito Pátrio.
Miguel Augusto Gonçalves de Souza, em sua clássica obra Acidentes do Trabalho, publicada pela Editora Revista dos Tribunais (edição de 1944), ao comentar o artigo 31 do Decreto-lei n. 7.036, de 10 de novembro de 1944, assim explanava:
Art. 31: O pagamento da indenização estabelecida pela presente lei exonera o empregador de qualquer outra indenização de direito comum, relativa ao mesmo acidente, a menos que este resulte de dolo seu ou de seus preposos.
“A análise do presente artigo tem suscitado acirradas controvérsias e conduz-nos à indagação: havendo legislação especial que regule minuciosamente os processos relativos aos acidentes de trabalho, poderá a vítima, contudo, abandonar o jus speciale e optar pela ação de direito comum, pela via ordinária?”
Já no decorrer da vigência do Decreto nº 24.637, de 10 de julho de 1934, se discutia acerca da possibilidade ou não da vítima abandonar o regime de exceção para optar pela via ordinária. Argumentava-se no sentido de que o artigo 12 do citado decreto não vedava a opção, não impedia a escolha da ação de direito comum, e que somente o pagamento da indenização tarifária exoneraria o empregador de suas responsabilidades decorrentes da legislação de acidentes.
O Decreto-lei 7.036 (vigente à época) é, indubitavelmente, estatuto derrogatório do direito comum. Consagra a teoria do risco profissional e se afasta, portanto, definitivamente, do campo da responsabilidade civil contratual ou extracontratual. Trata-se de norma legal de amparo ao trabalhador acidentado, exigida pelas condições de trabalho do mundo atual. O acidente será indenizado, independentemente da ocorrência, ou não, de culpa do empregador. Jus novum estabelece novos e particulares princípios aplicáveis aos infortúnios do trabalho; retira a matéria disciplinada do âmbito da lei antiga, apartando-a definitivamente do campo da responsabilidade civil.
O estatuto jurídico comentado consagra a teoria do risco profissional, determina o pagamento da indenização tarifária, estabelece a obrigatoriedade do seguro contra os riscos de acidentes do trabalho, regulamenta a matéria em suas diferentes fases e sob diversos aspectos e, além disso, edifica todo um sistema de amparo ao trabalhador vitimado, por meio de ampla assistência médica, hospitalar, odontológica, farmacêutica e ortopédica.
Observa-se, assim, que o Decreto-lei n. 7.036 constrói completo e autônomo sistema de direitos e obrigações aplicáveis à matéria disciplinada.
Autores: José Luiz Dias Campos e Maurício Morishita
Fonte: Revista Proteção
Foto: Beto Soares/Estúdio Boom
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